17/10/2020

"Shadows", a rever sempre

Talvez seja tudo uma questão de distância.
Física, antes do mais: é possível olhar as personagens, isto é, os actores de tão perto que não podemos deixar de sentir que a câmara pode tocar os rostos, os corpos, enredar-se em gestos e silêncios.
Narrativa, talvez: contar uma história não seria tanto colocar os actores, isto é, as personagens num determinado cenário, mas antes tratar os corpos como o primeiro e essencial cenário — como se tudo aquilo que está em volta fosse tão só um pressentimento (pré-sentimento?).
Simbólica: o mundo não existe numa escala fechada e normalizada, numa palavra, televisiva; cada vez que com ele produzimos em imagens e sons, inventamos a nossa própria escala, estabelecendo uma ordem que o reorganiza.
Dito de outro modo: há mais de seis décadas, nas convulsões das novas vagas e das produções independentes, Shadows (1959), de John Cassavetes, nasceu de um desejo de liberdade criativa que a passagem no tempo cristalizou e reforçou — a rever, sempre.

JL